Tem que ser corojaso para ter medo, tem que prezar pela paz para conseguir sentir raiva.
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Existe uma raiva que pulsa dentro de mim, raiva do que fiz e do que fizeram comigo e de mim. Raiva de não conseguir me impor e de ainda não ter achado equilíbrio entre os momentos bons e ruins.
Eu sinto raiva por me importar demais e por ainda sentir os mesmos medos e inseguranças de quando era adolescente. Raiva de nunca ter deixado para trás a vontade de ser aceita a qualquer a custo e de agradar a todos sempre.
Sinto raiva porque ainda não consegui me tornar a melhor versão de mim e sinto raiva de mesmo depois de anos de trabalho duro, de ainda não conseguir me amar e me acolher por inteiro.
A raiva me consome pois olho no espelho e ao enxergar minhas imperções e cicatrizes eu fico triste, pois ainda não lido tão bem com elas. Me sinto uma fraude por pregar tantas coisas e na realidade fazer tudo ao contrário. Eu não me orgulho de ser uma contradição, e não bato no peito para afrimar isso em medo.
Eu sinto raiva, pois sinto medo, e ter medo me faz ficar vulnerável, exposta, é tudo que eu nunca ser e nem transparecer. Lutei com todas as minhas forças para esconder minhas feridas, e aqui estou eu falando de todas elas.
Minhas palavras aliviam o peso que sinto em meus ombros, eu me agarro a esperança que ninguém se interresse por elas e que mesmo disponivél para quem quiser ler, esse seja um diário guardado a sete chaves.
Mas parte de mim se entristece de não ser ouvida. Afinal não é isso que todos queremos? Despejar nossos pensamentos em sentimentos em alguém que pareça estar disposto a nos ouvir? Não buscamos dialogos, vamos convir, buscamos ouvintes amadores e gratuitos, que nos emprestaram seus ombros cansados para que por alguns segundos possamos respousar.
Queremos alguém que nos ouça e que não vá pedir nada em troca, queremos a injustiça, o esgoísmo, por uma noite. Queremos nos permitir só pensar em nossas tristezas e nada mais, despersonificar o outro até que estejamos, praticamente, falando sozinhos.
No entanto queremos a certeza de não estarmos sozinhos e de não ter que lidar com o som de nossa própria voz, no fim queremos o outro para conseguir sair de nós. Para fingir que bater um papo com um amigo aliviou a minha alma, quando o monólogo disfarçado de conversa só serviu de paneira para dor e o medo que escorria de você sem destino certa e sem hora para parar.
Não queremos encarar nossos monstros, nossas falhas e defeitos, nos apegamos a tudo para fungir da tristeza e do vazio de uma vida mediócre. Inventamos desculpas para não constatar o inévitavel, nossa existência só é imprescindivél para nós mesmos.
Se agora deixarmos de existir a vida continua, o mundo não vai deixar de ser mundo só porque não vamos mais estar aqui. Fugimos do medo e da raiva, porque acreditamos que esses são sentimentos ruins, queremos ser calmos e corajosos, porém, no final, tudo que somos, é bons mentirosos.
E nessa vida de mentiras seguimos adiando o dia em que teremos que nos olhar no espelho e ver ali refletido a verdade, que vão existir momentos em que seremos apenas, medrosos, raivosos, egoístas que não se amam, seremos pessoas falhas e feias, que não vão mudar o mundo e talvez nem mudar para sempre a vida de ninguém.
E quando nos damos conta disso, somos enfim, livres, somos pessoas que deram de cara com seus principais medo e angustias, pessoas que encontraram a raiva e o desamor, mas que continuam vivas, vivas e prontas para serem verdadeiras consigo e com o mundo. Livres para buscar contruir diálogos no lugar de monólogos. Livres para sentir raiva e medo, sem se olhar no espelho e chorar por isso. Livres para ser exatamente como somos, sem buscar a perfeição. Livres…